Publicação

19/06/2020em Institucional
Breves apontamentos sobre Direito Sistêmico e postura sistêmica

O Direito Sistêmico defende que só há direito e justiça quando o sistema todo está equilibrado e em paz, o que exige esforços de todas as partes

Por Natália da Rocha Guazelli de Jesus, OAB/PR 54.176 e OAB/SP 407759

A reforma do Código de Processo Civil, ocorrida em 2015 – o primeiro a ser editado durante o regime democrático brasileiro – trouxe nuances indicativas da necessária mudança de paradigmas em relação à forma de condução dos processos e procedimentos até então praticados. O Relatório Justiça em Números, produzido pelo Conselho Nacional de Justiça também em 2015, revela o crescimento expressivo de demandas judiciais se comparados os números ocorridos no ano anterior, 2014, e o consequente crescimento da despesa total do Poder Judiciário.

É fato inconteste que o Poder Judiciário, tal como estruturado, não estava mais suportando a demanda e, dentre inúmeras medidas propostas pelo legislador com a reforma, destaco no presente texto a atribuição ao Estado da responsabilidade por promover, dentro da medida do possível, a solução consensual dos conflitos, consolidando a conciliação e mediação, bem como abrindo espaço para o que o legislador denominou de “outros métodos de solução consensual de conflitos”.

Durante a militância profissional, foram inúmeros os casos em que presenciei as sentenças judiciais desagradarem ambas as partes, culminando na interposição de recursos e diversas tentativas de reforma do julgado e, sobretudo, na insatisfação dos jurisdicionados, partes processuais e inclusive colegas de profissão.

Essa busca do Poder Judiciário por soluções alternativas, ao meu ver, tão somente trouxe à luz a necessidade de mudança de paradigma, bem como o reconhecimento da inevitável atuação cooperativa de todos os sujeitos do processo. Neste sentido, a reforma do Código de Processo Civil trouxe novas oportunidades e formas de pensar e atuar no Direito, responsabilizando também juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público por estimular a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos, inclusive no curso do processo judicial.

O Direito Sistêmico, segundo o juiz Sami Storch, corresponde a “uma visão sistêmica do direito, pela qual só há direito quando a solução traz paz e equilíbrio para todo o sistema”, ou seja, propõe que somente é possível que a prestação jurisdicional seja exaurida na medida em que as partes conseguem atingir o equilíbrio. O Dr. Sami foi um dos pioneiros no uso das técnicas da Constelação Familiar e postura sistêmica associadas ao Direito. A eficiência foi tamanha que o próprio Conselho Nacional de Justiça passou a validá-la como abordagem para solução alternativa dos conflitos, esclarecendo que intenção da utilização no Poder Judiciário visa facilitar com que as partes possam perceber o que há por trás do conflito que gera o processo judicial.

O médico cirurgião Décio Fábio de Oliveira Júnior, instrutor do Curso de Formação em Organização Sistêmica – Módulo I, promovido no Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF), acrescenta ainda que: “As constelações são um método inovador, que nos permite compreender que as relações humanas são sensíveis à postura. Ou seja, quando nós compreendemos que essa postura se move, baseados no princípio do método, a outra pessoa também modifica o comportamento dela, modulando, então, a postura do interlocutor. A pessoa que aprende esses princípios pode alterar a forma como os relacionamentos acontecem”.

A atuação sistêmica, seja mediante adoção da postura sistêmica ou ainda do uso das ferramentas e técnicas aprendidas ao longo dos estudos realizados, proporciona um olhar panorâmico sobre a demanda trazida pelo cliente e, sobretudo, a observação dos detalhes que relacionam-se ao conflito apresentado. Essa abordagem proporciona a atuação profissional mediante o uso da técnica jurídica de forma pontual e precisa para auxiliar na solução do conflito, seja na esfera judicial ou extrajudicial.

O olhar humanizado utilizado no atendimento sistêmico proporciona ainda o alinhamento de expectativas entre a pretensão do cliente e o que realmente é possível por intermédio da atuação judicial ou extrajudicial. Isso estimula a autonomia, responsabilização e conscientização do cliente ao longo de todo processo, em busca da solução do conflito e das particularidades que o conduzem à tão almejada justiça.